Eduardo Bueno é escritor, jornalista, editor e tradutor. Com a Coleção Brasilis, que reúne A Viagem do Descobrimento, Náufragos, traficantes e degredados, Capitães do Brasil e A coroa, a cruz e a espada, tornou-se o primeiro autor brasileiro a emplacar simultaneamente quatro títulos entre os cinco primeiros nas listas de mais vendidos dos principais jornais e revistas do país. Eduardo também traduziu 22 livros, sendo o principal deles o clássico On the Road – Pé na Estrada, de Jack Kerouac, que marcou o desembarque da “literatura beat” no Brasil, com 30 anos de atraso. Ao longo das décadas de 1980 e 1990, editou mais de 200 títulos, de autores brasileiros e estrangeiros, tendo colaborado com algumas das principais editoras brasileiras. Como jornalista, trabalhou nos principais veículos de comunicação, entre eles a Rede Globo, a TV Cultura, a TVE-RS e os jornais O Estado de S. Paulo e Zero Hora. Já dirigiu e estrelou um programa sobre história do Brasil no Fantástico, da TV Globo, e foi o primeiro apresentador do History Channel no Brasil. Eduardo Bueno ganhou dezenas de prêmios, dentre eles o Jabuti, em 1999, e a Ordem do Mérito Cultural, comenda concedida pelo Ministério da Cultura do governo federal.
A Viagem do Descobrimento, lançado originalmente na década de 90, ganhou agora uma excepcional edição revista e ampliada, lançada pela Estação Brasil, selo da Arqueiro/Sextante, um selo descrito como "um ponto de encontro dos leitores que desejam redescobrir o Brasil". Bem, confesso que o selo cumpriu muito bem seu papel, pois não somente redescobri o Brasil, mas descobri outras coisas que ainda não me haviam sido apresentadas no contexto escolar. E a importância disso deve-se, principalmente, ao fato dos assuntos apontarem para um futuro real, e esse vindouro será tanto melhor quanto mais e melhor conhecermos o nosso passado e a nós mesmos.
O livro é acompanhado, inicialmente, de uma apresentação feita por Jorge Caldeira, um escritor, que faz um excelente apanhado do que nos espera nas próximas páginas. Acredito que essa apresentação é o ponto forte, alto e decisório na questão de prosseguirmos ou não com a leitura, e isso é feito de maneira suficientemente boa para que cumpramos com tal ato. Ademais, somos levados a uma introdução que apresenta um apanhado bem rápido, porém detalhista, de como se deu a chegada da expedição de Cabral ao Brasil. Os capítulos posteriores a isso, posso dizer, surgem como um destrinchamento ainda maior do que é abordado na introdução e, gente, só há uma palavra capaz de descrever todo esse destrinchamento: Incrível!
No primeiro capítulo, intitulado "De Lisboa a Vera Cruz", vemos da mais ampla forma possível como se deu toda a decisão e a preparação da expedição rumo as Índias. Fatos como o salário que os capitães receberam em favor da expedição — incluindo o do próprio Cabral, que recebeu uma fortuna —, a questão da iniciativa privada para custear a expedição, as duas divisões da frota de Cabral, como se deu a partida em Lisboa, como era composta a tripulação e do que se alimentavam até o momento em que — segundo o autor — "a armada de Cabral seguiu as instruções de Vasco da Gama e abriu seu rumo para sudoeste, empreendendo a 'volta ao mar', e acabou 'achando' o Brasil" são pontos apresentados nesse primeiro momento do livro.
Dando continuidade, temos o segundo capítulo todo e inteiramente falando sobre as conquistas de Portugal. Mas por que é importante, nesse contexto de "achamento" do Brasil, conhecer as conquistas de Portugal? É isso que, nesse segundo momento do livro, de forma ora sucinta, ora prolixa, que o autor deixa insanamente claro, principalmente ao mostrar como se deu toda a "ideia" de viajar até as Índias e como por meio disso a frota de Cabral foi parar no Brasil — enaltecendo inclusive que, em virtude, nesse caso, da grande ideologia portuguesa de conquistar e ter tudo, o Brasil pode não ter sido descoberto ao acaso, mas em prol de uma atitude intencional.
Ademais, temos o terceiro e último capítulo, o melhor em minha opinião, onde o autor debruça-se sobre os principais relatos da época — em destaque a Carta de Pero Vaz de Caminha —, e conta de uma forma admirável os 10 dias em que a frota de Cabral ficou no Brasil. Fatos como o choque cultural e sociológico, a convivência e o trato com os indígenas e o que Cabral fez ao "descobrir" a nova terra são, em suma, os tópicos abordados nesse capítulo, que fecha com chave de ouro o que certamente é, como ressaltou Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente do Brasil, "uma síntese de séculos de nossa história," onde "(...) não há melhor introdução para um público não especializado que queira ter uma noção da história do Brasil".
A tese de Capistrano também pode ser usada para encerrar a discussão sobre os supostos precursores lusos de Cabral: se alguma expedição portuguesa de fato chegou ao Brasil antes da de Cabral, seu significado histórico foi praticamente nulo. A terra só seria integrada ao império ultramarino lusitano após o desembarque de Cabral — e, ainda assim, muito lentamente, como se sabe. De todo modo, passados mais de 500 anos, o descobrimento do Brasil continua sendo um capítulo aberto na história da expansão ultramarina portuguesa — e isso só aumenta o seu fascínio.
Nunca havia nem ouvido falar em Eduardo Bueno, tampouco em sua coleção que debruça-se sobre boa parte da história do "achamento" do Brasil. Contudo, devido principalmente ao meu fascínio pela História, quando fiquei sabendo do lançamento de uma nova edição do livro, não hesitei em fazer o pedido para a Editora Arqueiro/Sextante. Minhas expectativas eram altíssimas, e acredito que já deu para perceber que elas foram superadas — fiquei surpreso ao descobrir que o autor não é historiador!
A narração jornalística de Bueno é única — eu poderia dizer — e é interessante justamente por fugir, mesmo que brevemente, ao academicismo e ao rebuscamento, e adentrar mais no simples, compreensível, objetivo e mais detalhista — deixando claro que, em suma, esse "detalhamento" é inerente aquilo que é fundamental. O autor, em terceira pessoa, conta-nos os fatos e acontecimentos de forma tão bem feita que, por ora, sentimos-nos como se estivéssemos realmente viajando por mares tempestuosos, em meio a perigos desconhecidos ou calmarias enervantes. Há, sim, muitos detalhes, mas a importância deles está principalmente no fato de que os mesmos não constam nos livros de História — que tanto de julgam didáticos. Eduardo Bueno conta em 128 páginas o que o livro de História conta em dois parágrafos.
Muita coisa me chamou atenção no livro — muita mesmo! —, mas o fato do autor trabalhar constante e intrinsecamente a possibilidade da expedição de Cabral ter "descoberto" o Brasil de forma intencional é o que mais me deixou animado para com a leitura. Nada melhor do que uma teoria conspiratória, hein? E o autor debruçou-se de tal forma que acabou me convencendo de que, sim, o Brasil não foi descoberto por acaso, e que, não, Portugal não foi pioneiro em "descobrir" o Brasil — na verdade, Portugal foi pioneiro no descobrimento sociológico de nossa nação, contudo de todo modo os lusitanos não nos "descobriram", e, sim, nos acharam.
Drauzio Varella, médico e escritor, ao ler A Viagem do Descobrimento, disse o seguinte: "Ele [o autor] conta a história do jeito que deveria ser nas escolas: sem aquele monte de datas para decorar." Bem, eu não sei que livro Drauzio Varella leu, mas com certeza não foi A Viagem do Descobrimento. Não que o médico esteja de todo errado, mas também não está de todo certo. O que mais tem no livro são datas, pessoas, lugares e acontecimentos. Não há como dizer "sem aquele monte de datas para decorar". Agora, sim, o autor conta do jeito que deveria ser nas escolas, ainda que eu esperasse bem mais dele, porque ele fugiu, sim, do por vezes chato academicismo, mas foi visível que ele poderia ir além.
Quanto as datas, lugares e pessoas, é o seguinte: não há como estudar e compreender a História sem as datas, os lugares e as pessoas! Sem esses três fatores, para mim tais fatos deixam de ser História e tornam-se total e puramente fatos, sem qualquer relevância. Eduardo Bueno usou muitas datas, porque realmente foi necessário, mas isso ainda é um olhar histórico sobre todo o processo, e a História não sobrevive sem datas. Um professor de História meu disse que o Bueno é anacrônico, e eu não deixo, de certo ponto de vista, de concordar com ele, mesmo que diferimos no sentido de que o professor acha isso ruim e eu, fundamental. Bueno vai e volta nos fatos, mas ele faz isso porque fica mais fácil de compreendermos do que puramente vermos as coisas em sequência, numa determinada cronologia.
Quanto a edição do livro, eu achei fantástica, principalmente a capa, que faz um contraste opulente entre a beleza da simplicidade do exterior a riqueza de conteúdo do interior. Sem contar que as capas da Coleção Brasilis combinam entre si, então para os perfeccionistas como eu, é um tiro que não saiu pela culatra. A diagramação e o design interior também são incríveis, com ótimas fontes, conteúdos bem dispostos e diversos boxes laterais contendo conteúdos extras inerentes a cada episódio que nos conta o autor. Não encontrei também nenhum erro de revisão. E não sei se já deixei claro uma coisa, mas o único "problema" que você irá encontrar nesse livro é a riqueza de conhecimento.
Ademais, deixo claro que foi uma ótima e rápida leitura — são pouco mais de cem páginas —, onde me senti cada vez mais rico em conhecimento, já que mais de 50% do livro me era desconhecido. E o pior de tudo é que isso me escapou mesmo sendo um ávido "devorador" das aulas de História — o que significa que temos de repensar o que andam ensinando nas escolas. Indico o livro para todos os amantes de História ou simplesmente para todos aqueles que desejam conhecer um pouco mais de nossa própria história e como se deu nossa identidade. É um pequeno gesto que já nos tira de uma grande ignorância, eu garanto. Leitura muito mais que recomendada! Para mim, deveria ser leitura obrigatória em todas as escolas.
Primeiro parágrafo do livro: “Como tapes flutuantes, elas surgiram de repente, 'em muita quantidade', balançando nas águas translúcidas de um mar que refletia as cores do entardecer. Os marujos as reconheceram de imediato, antes que sumissem no horizonte: chamavam-se botelhos as grandes algas que dançavam agrupadas nas ondulações formadas pelo avanço da frota imponente.”
Melhor quote: “Que significado teve essa descoberta? Na verdade, não apenas naquele exato instante, mas pelas três décadas seguintes, ela representaria pouco mais do que um intervalo idílico em meio a uma longa e tediosa navegação oceânica.”