Sinopse: Frank Dodd está morto e a cidade de Castle Rock pode ficar em paz novamente. O serial killer que aterrorizou o local por anos agora é apenas uma lenda urbana, usada para assustar criancinhas. Exceto para Tad Trenton, para quem Dodd é tudo, menos uma lenda. O espírito do assassino o observa da porta entreaberta do closet, todas as noites. Nos limites da cidade, Cujo - um são-bernardo de noventa quilos, que pertence à família Camber - se distrai perseguindo um coelho para dentro de um buraco, onde acaba sendo mordido por um morcego raivoso. A transformação de Cujo, como ele incorpora o pior pesado de Tad Trenton e de sua mãe, e como destrói a vida de todos à sua volta, é o que faz deste um dos livros mais assustadores e emocionante de Stephen King.
Os Trenton parecem ter uma vida perfeita e feliz: Donna e Vic são um jovem casal que nunca teve uma crise no casamento e são apaixonados um pelo outro, têm um filho lindo, uma boa casa e uma vida tranquila. Mas nem tudo permanece tão bem assim. Donna passa a se sentir muito triste e com medo quando está sozinha em casa. Em pouco tempo, ela está construindo uma perigosa relação extraconjugal com Steve Kemp, um homem violento e egocêntrico. Enquanto isso se desenrola e Donna passa a ser dominada pela culpa, Joe Camber conserta carros e mantém sua fama de bom mecânico — apesar da sua brutalidade constante — além de sustentar sua família: Charity, sua esposa, e Brett, o filho deles, além do agregado cachorro de estimação, Cujo, um são-bernardo enorme e muito manso.
Vic já viu como Joe trabalha bem quando, certa vez, precisou de seus serviços. Quando o Corcel de Donna passa a apresentar problemas, seu marido logo pensa em mandar o carro para a oficina de Joe. Porém, sua cabeça vira um turbilhão e não há tempo de pensar em ligar para o mecânico quando recebe um bilhete de Steve assumindo ser o amante de Donna e, ainda por cima, a empresa de publicidade que Vic mantém com seu amigo, Roger, está enfrentando sérias dificuldades. Com tantas coisas o atormentando, Vic viaja para Boston. No tempo em que está fora, Donna percebe que seu carro precisa seriamente de um conserto. Ligando para a casa dos Camber, que, estranhamente, não atendem as ligações, Donna resolve ir até lá junto com Tad. Qual não é sua surpresa quando, chegando na casa deserta de Joe, seu carro morre ao mesmo tempo em que o monstro do closet de Tad surge para atormentá-los na forma de um cão.
Qualquer livro de Stephen King é um atrativo e tanto para mim. Quanto mais obras leio do autor, mais me interesso por outras. São diversas facetas que ele mantém com uma fórmula perfeita em sua escrita contundente — e ela quase sempre funciona. Apesar de comumente ser classificado como Mestre do Terror, Mestre do Thriller Psicológico, entre outros títulos, não vejo King dessa forma — apesar de seus grandes sucessos serem classificados nesse gênero —, pois o autor tem muitos ângulos e é capaz de surpreender em muitos deles. Porém, é via de regra o quanto seus livros mexem com o psicológico do leitor, portanto, sempre que pego uma obra de King para ler, espero algo eletrizante, que me tire da zona de conforto e talvez me deixe ter um sono conturbado à noite. Com Cujo não foi diferente.
O narrador é em terceira pessoa e onisciente. Tem como foco narrativo todos os personagens importantes para a trama — não sendo necessariamente os protagonistas — e adentra em seus pensamentos mais profundos e loucos, revelando seus medos e desejos. Talvez por isso as obras de King sejam classificadas como assustadoras: ele mostra alguns lados do ser humano, que nós, pertencentes à esta espécie, preferimos ignorar. Em suma, ele mostra o lado selvagem. E não apenas dos humanos, mas também dos cachorros. Neste caso em especial, de um são-bernardo chamado Cujo.
"O medo era um monstro de dentes amarelados, criado por um Deus enfurecido para devorar os incautos e os ineptos" (p. 59).
Cada personagem é construído de forma a envolver e tocar (com uma frieza e brutalidade imperceptíveis) a psique do leitor. Por conta da descrição sensitiva que o livro possui, é possível sentir, mesmo que seja mentalmente, tudo o que personagem sente — ainda que não haja identificação. Todos eles são criados com muitas imperfeições que fazem tudo parecer complicado quando na verdade é tão simples. O protagonismo não fica claro, mas isso não se fez muita diferença já que a alternância de foco entre os personagens — especialmente Donna, Vic, Tad e Cujo — era tão frequente.
Há dois lados a serem trabalhados neste livro pelos leitores: um é o de que Cujo encarnou o sobrenatural medo de Donna e Tad e ele está ali, naquele momento e daquele jeito, porque o destino — ou algo ainda mais assustador — o levou ali. O outro é o de que o cachorro nada mais é do que uma fatalidade, um acontecimento casual e banal. É comum cachorros adquirirem raiva, portanto, não é ele que é o monstro, o imperfeito, o grande problema — os humanos é que são, os personagens que erraram, que pensam de forma tão complexa que não conseguem ver o quanto aquela situação estava permeada de um drama que eles mesmos causaram. Quando o leitor consegue enxergar por algum desses lados, ele decide o quanto quer que o livro o afete.
Apesar de toda a complexidade dos personagens humanos, o que mais me surpreendeu foi o personagem de Cujo. Ler um thriller psicológico sob o ponto de vista de um cão com raiva toma uma perspectiva diferente — por isso optei pela segunda opção de interpretação entre as duas que citei acima. O cão via tudo com simplicidade e foi espetacular ler acerca de sua transformação de um cachorro comum que amava seus donos e era sempre obediente, até chegar a "máquina de destruição" com a mente perturbada e corroída pela doença que lhe tomou.
"Sempre achei que o tipo de livro que eu escrevo [...] devia ser uma espécie de agressão pessoal. Devia ser alguém pulando por cima da mesa, devia agarrar e intimidar o leitor. Devia provocá-lo. Devia incomodá-lo, perturbá-lo [...]. Em algum momento da vida, a gente chega a um ponto em que é preciso lidar com algo que pareça inexplicável [...] Então, quer se trate de fantasmas, vampiros ou vizinhos criminosos de guerra nazistas, é sempre o mesmo assunto, ou seja, uma invasão do extraordinário na vida normal e a maneira como lidamos com isso. O que isso revela sobre nosso caráter e nossas interações com outras pessoas e a sociedade em que vivemos me interessa muito mais do que monstros, vampiros, zumbis e fantasmas".
— Entrevista de Stephen King feita para a revista The Paris Review, 2006.
Meu arcabouço literário de King não é tão extenso, mas confesso que essa foi uma das leituras mais lentas que já fiz do autor. O ritmo eletrizante só passa a ser realmente assim perto do desfecho. Mas o fato é que as coisas vão ocorrendo tão lentamente — ele se demora muito em detalhes que não têm grande relevância para o todo da história, que são apenas elementos complementares dos personagens ou dos cenários — que a leitura se torna rápida, já que o desejo do leitor é chegar logo ao clímax e saber o que vai acontecer, afinal. "Onde tudo isso vai dar?" é a pergunta que ronda toda a leitura. E para tornar as coisas mais interessantes, King criou a partir dessa pergunta diversos elementos-surpresa.
Essa nova versão da obra foi a melhor que vi até agora, superando facilmente as anteriores. Agora em capa dura e com a ilustração da pata em alto-relevo, o livro ganhou o toque de mistério que precisava para se adequar à trama. Também me agradou muito que a Suma manteve o título original, que é o nome do cachorro, e não seguisse a tradução que permaneceu no Brasil desde que a obra foi lançada aqui, Cão Raivoso. Muitos que leram esta antiga edição se incomodaram com os erros básicos de revisão e tradução (foram muitas versões, na verdade, e eram pouco satisfatórias). Nesta edição os erros de revisão foram quase imperceptíveis e ainda conta com um bônus: uma entrevista completa dada por King para a The Paris Review em 2006, onde ele fala sobre sua carreira, Cujo e outras obras.
Primeiro parágrafo: "Há nem tanto tempo assim, um monstro apareceu na cidadezinha de Castle Rock, estado do Maine. Ele matou uma garçonete chamada Alma Frechette em 1970, uma mulher chamada Pauline Toothaker e uma pré-adolescente chamada Cheryl Moody em 1971, uma linda moça chamada Carol Dunbarger em 1974, uma professora chamada Etta Ringgold no outono de 1975 e, por fim, uma menininha chamada Mary Kate Hendrasen no início do inverno daquele mesmo ano".
Melhor quote: "O mundo era frágil, tão frágil quanto um ovo de páscoa: lindo por fora, oco por dentro".
Oi Bianca, esse ano eu comecei a prestar mais atenção nas obras do Stephen King e estou cada vez mais apaixonada por ele. Já tinha visto esse livro e ele está minha lista. Pretendo matar a sede dos livros dele nesse novo ano.
ResponderExcluirBeijos
Quanto Mais Livros Melhor
Oii!
ResponderExcluirEu li a primeira obra de Stephen King esse ano, até então não tinha curiosidade em ler os livros do autor. Hoje sou apaixonada e fã dos livros do cara. Nossa, ele é mestre em histórias envolventes e apaixonantes. O primeiro livro virou em dois, depois três. Sim, li a trilogia Billy Hodges e fiquei querendo mais. Vou procurar mais obras dele para o próximo ano.
beijos
http://mecontanoblog.blogspot.com.br
Oi, Bianca. Só um detalhe, você não mencionou o nome do tradutor.
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