Josh Malerman é cantor e compositor da banda de rock
High Strung.
Caixa de Pássaros é o seu romance de estreia e
Piano Vermelho é um de seus mais recentes romances.
Philip Tonka e seus amigos da banda Os Danes, de Detroit, recebem uma inesperada visita de alguém importante no Exército dos Estados Unidos. O que o homem deseja deles é o que mais os deixam desconfiados. E com razão. O secretário Mull propôs que voassem até um deserto na África para "identificar a fonte de um som perigoso", ouvido pela primeira vez em 1948, quando surgiu em um teste de rádio de rotina em Tallahassee, na Flórida. Em pouco tempo, identificar a fonte virou prioridade do Pentágono. Mas em algum momento ficou evidente que, se quisessem saber o que estava produzindo aquele som, era preciso ir até sua origem. Já haviam enviado dois pelotões. Todos soldados. Nenhum músico. É por isso que Mull estava interessado em Os Danes. E com todo o dinheiro envolvido, por que o grupo de músicos recusaria o convite? Bem, talvez tivessem recusado se soubessem que nenhum pelotão voltou da operação realizada no deserto do Namibe, na África.
Dias após a partida de Os Danes, com a visão periférica fora de foco, Philip acorda no que parece uma hospital militar. Ele se lembra de cada detalhe do deserto e o som de uma música composta por ele está sumindo, como se, enquanto ele dormia, tivesse tocado sem parar, a trilha sonora de seu sono inacreditável. O músico descobre que está gravemente ferido, uma lesão sem precedentes. Para o médico, sua sobrevivência parece injusta, algo incrivelmente difícil de acontecer. Se Philip tivesse quebrado apenas os pulsos e os cotovelos, poderia-se supor que caiu no chão de certa forma. Mas também quebrou os úmeros, os rádios e as ulnas. Suas tuberosidades radiais, os processos coracoides, as trócleas e todos os vintes e sete ossos das mãos também estão quebrados. Ele não quebrou apenas os pulsos e cotovelos, ele quebrou e esmagou quase todos os ossos do corpo.
Philip ainda é capaz de vê
marcas de cascos, um rastro de pegadas se estendendo. E também
ouve o som, doentio e sensível. Ele nunca mais conseguiu ser o mesmo depois de ter ouvido aquilo que foi capaz de criar sua própria trilha, curvando-se sobre o horizonte de sua memória. O música tentava combatê-lo com a música que compôs. Ele e
Os Danes. A canção que lhe fez companhia durante o tempo em que esteve em coma. Enquanto rememora cada segundo que passou no deserto, as primeiras perguntas que o médico faz a Tonka são:
como ele poderia sobreviver a isso? O que aconteceu? O que ele encontrou? Mas na verdade,
a pergunta mais importante não é o que ele encontrou... mas o que encontrou ele.
"— Muito bom. — Após uma breve hesitação, o homem continua: — Então me conte como encontrou o primeiro cadáver.
— Também falei sobre isso tudo para o Dr. Szands.
— Sim. Mas eu queria ouvir de você. Às vezes, ao ouvir pessoalmente, é possível desenterrar novas informações".
E aqui estou eu para falar do novo
thriller do autor que abalou o mercado literário de 2015 com o sucesso
Caixa de Pássaros, que ganha em breve uma adaptação pelo serviço de
streaming Netflix. Bem, não é novidade para ninguém que
Caixa de Pássaros foi o livro mais impactante que já li até hoje — uma obra prima da literatura, um divisor de águas num mercado saturado e com carência de originalidade. No entanto, a primeira coisa que se precisa saber é que
não se deve esperar que Piano Vermelho seja um Caixa de Pássaros, porque, apesar de toda a maestria em sua construção,
ele não é afinado como o canto dos pássaros presos na caixa de Malorie.
Mesmo que não seja, digamos, tão bom quanto Caixa de Pássaros, eu pude perceber que Piano Vermelho é tão peculiar quanto o romance de estreia de Malerman, que quando questionado sobre o porquê de escrever obras sombrias, enigmáticas e com finais que nem sempre caem no gosto do leitor, respondeu que prefere acreditar que existem "coisas" que estão além da compreensão humana. Não podemos negar isso, certo? Acredito até que seja um excelente argumento para explicar suas tramas que seguram sempre um "grande segredo" e tomam cuidado para não haver furos e revelações grandiosas, mesmo lidando com passado e presente ao mesmo tempo.
Mas a pergunta que não quer calar em 2017 é: por que o Piano Vermelho desafinou? Resposta de número 1: porque os leitores foram com muita sede a um pote que não prometia um oceano de água. Resposta de número 2: porque o final conseguiu ser ainda mais louco que o de Caixa de Pássaros, exigindo do leitor diversas releituras e o desenvolvimento de teorias. Não obstante, cabe a mim fazer mais duas perguntas para vocês, leitores: é justo "acabar" com um livro só porque o final dele não nos agradou? Não deveríamos utilizar nossa inteligência humana para pesquisar, estudar a obra, ler suas entrelinhas e buscar entender o que motivou um autor a manter determinada essência em sua obra? Depois de ler Caixa de Pássaros, é ridículo esperar sanidade da parte de Josh Malerman.
Não vou mentir, eu também me senti muito frustrado com o final de Piano Vermelho — que foi desenvolvido com certa obscuridade, talvez para combinar com a obra em si. Não sei! O que realmente posso falar é que nem por isso eu desconsiderei que foi uma leitura sinistra, emocionante, perturbadora e eletrizante. Não como a de Caixa de Pássaros, mas ainda assim com alternância de cenários, capítulos curtos, arrepiantes, instigantes e misteriosos. O problema é que esperamos que os autores que são consagrados com determinadas obras façam todas as demais espelhadas nelas, mas não é assim. Nem todo livro de Machado de Assis é como Dom Casmurro. Nem todo poema de Edgar Allan Poe é como O Corvo. Nem todo Piano Vermelho será como Caixa de Pássaros. Isso torna alguma das quatro obras menos especiais? Claro que não!
"Os chapéus elaborados parecem majestosos para nós, mas, no fim das contas, aquelas pessoas estavam apenas matando umas às outras. Todas as guerras são travadas pelo mesmo motivo. Por causa disso, são todas a mesma guerra".