S O B R E O S O R G A N I Z A D O R E S
George R. R. Martin é autor e roteirista de filmes de ficção científica. É conhecido pela série Game Of Thrones - A Guerra dos Tronos, adaptada dos best-sellers de romance épico As Crônicas de Gelo e Fogo. Gardner Dozois já ganhou quinze prêmios Hugo por seu trabalho como editor, além de dois prêmios Nebula como escritor, na categoria melhor conto. Foi editor da Asimov’s Science Fiction por vinte anos e já escreveu e editou mais de cem livros, incluindo vários volumes da The Year’s Best Science Fiction.
O Príncipe de Westeros e Outras Histórias é uma
antologia de contos de temática específica organizada por
George R. R. Martin e
Gardner Dozois. Como a maioria de vocês já deve ter percebido — ou não! —,
o livro já foi resenhado aqui no blog há um ano atrás pela Gabi, quando foi lançado pela
Saída de Emergência (
confira a resenha aqui). Contudo, acredito que quanto mais críticas/avaliações inerentes a uma obra, melhor para a mesma.
O sucesso editorial foi relançado pela Editora Arqueiro, recebendo ISBN novo e, obviamente, uma nova edição. Evitando assim repetições, farei uma resenha diferente da anterior. Como a resenha antecedente abordou o todo do livro, essa abordará as partes, falando sobre cada um dos contos e finalizando com um apanhado geral. É de suma importância que deem uma olhada nas duas resenhas, pois, apesar de serem sobre um mesmo livro, não são feitas pelas mesmas pessoas. Feito isso, avancemos!
O Príncipe de Westeros e Outras Histórias, como dito inicialmente, é uma antologia de contos com temática específica (
canalhas), que no original recebeu 21 contos; mas na edição brasileira, conta com 10. O livro se inicia com uma
INTRODUÇÃO feita por
George R. R. Martin (autor de
Game Of Thrones) com a seguinte frase: "Todo mundo ama um canalha, embora, às vezes, a gente sobreviva para se arrepender". E, pessoal, ele não poderia estar mais certo quanto a isso!
Histórias sobre desavergonhados, vigaristas e malandros são sempre capazes de nos prender e, em meio a enredos impecáveis e o uso de um humor inteligente, nos fazer virar as páginas com uma ansiedade vertiginosa de conhecer mais e mais dos protagonistas e de suas aventuras.
E, como sempre, o Rei da Literatura não deu ponto sem nó. O objetivo não era de todo editorial — a intenção do autor era, antes de tudo, fazer com que expandíssemos nossos horizontes e nossa maneira de olhar o mundo, seja em virtude da variedade de gêneros presentes na obra ou em relação ao caráter dos personagens; que podem ser vigaristas, mas ainda são seres humanos. Para Martin, "limitar a leitura em um único gênero acaba com essa missão" de expandir nossos horizontes. E isso nos torna menores. No fim da INTRODUÇÃO, alertados para que tomemos cuidado, pois alguns cavalheiros e encantadoras damas daquelas páginas não eram tão confiáveis assim, já somos inicialmente ganhos e incentivados a expandirmos nossa visão e ler gêneros diferentes com uma temática agradável e que, sem dúvida alguma, é instigante no meio literário.
O primeiro conto, COMO O MARQUÊS RECUPEROU SEU CASACO, de autoria do renomadíssimo Neil Gaiman, leva-nos a atmosfera fantástica, e um tanto surreal, da Londres de Baixo, o cenário de seu famoso romance Lugar Nenhum. Vale ressaltar que Gaiman não foi o único a reutilizar o cenário de um de seus livros, embora isso não tenha sido um problema para mim, visto que ele conseguiu dar as informações necessárias ao entendimento do conto e de seu protagonista. No conto, conhecemos o Marquês de Carabas, uma especie de "sabe tudo e faz tudo", que perdeu seu incrível, lindo e extraordinário casaco, e decide tê-lo de volta — mesmo que isso envolva uma aventura com seres surreais, animais e vegetais. A história tem um desenrolar rápido e um humor leve, mas que, de certa forma, é amenizante. Narrado em terceira pessoa, sendo objetivo e dando espaço a diálogos repletos de ironias e sarcasmo, Gaiman realmente nos leva a uma aventura que demonstra que às vezes a roupa faz o homem — literalmente. Apesar de bem feito, de 0 a 10, eu daria 8 ao conto — pois imagino que o enredo poderia ser melhor desenvolvido, e isso não é difícil para quem já venceu quatro prêmios Hugo, dois Nebula e quatro Stoker.
E, dando continuidade, somos apresentados ao PROVENIÊNCIA, de autoria de David W. Ball, o conto que merece mais atenção, devido principalmente a carga excessiva, porém interessante, de informações. Saímos então da Londres de Baixo para adentramos diretamente em Nova York, onde, através de uma ficção com enredo histórico-artístico, conhecemos Max Wolff, dono de uma galeria de arte. Max estava intrigado, pois havia recebido um bilhete de um desconhecido que desejava, sem conhecimento algum, vender um quadro, desaparecido desde a Segunda Guerra Mundial, de Caravaggio. Passamos então a conhecer toda a história — super vigarista e nota 10 — da obra e de como ela foi parar nas mãos de Wolff. E, pessoal, é muito sinistro esse conto — um dos melhores do livro! Com uma narração ainda em terceira pessoa e um enredo chamativo, a partir desse conto já passamos a perceber que, se não todas, boa parte das histórias serão inteligentes e gostosas de se ler.
E chega então
o conto que eu mais gostei (nota 10!). Da incrível e renomadissíma
Gillian Flynn, autora dos
best-sellers Garota Exemplar,
Lugares Escuros e Objetos Cortantes, conhecemos
QUAL É A SUA PROFISSÃO?, um
suspense psicológico e horripilante que não fica devendo para nenhum outro. Conhecemos no conto uma ex-prostituta que agora finge ser cartomante e pratica outras pequenas fraudes, mas os resultados desse "fingimento" jamais poderiam ter sido previstos por ela.
São tantas as reviravoltas do conto, que quando finalizei estava tonto, mas contente e surpreso. Com uma narração em primeira pessoa — que se mostrou mais agradável —, a autora seguiu o tempo inteiro objetiva, mostrando que embora seja sempre bom ter ambições profissionais, às vezes o plano de carreira pode nos conduzir a um território muito perigoso. Em 2016, Flynn decidiu lançar o conto em uma edição separada, lançada este mês no Brasil, pela Intrínseca. A edição recebeu o nome de
O ADULTO e venceu um dos maiores prêmios da Literatura, o
Edgar Allan Poe de "Melhor Conto".
E como nada nunca é perfeito, chegamos a um conto que eu dei 7, que é o UM JEITO MELHOR DE MORRER, do britânico Paul Cornell — que me chateou, pois sempre digo que os britânicos são os melhores contadores de histórias. O conto, narrado em terceira pessoa, foi um reaproveitamento de cenário/personagens que, diferente do conto de Neil Gaiman, não deu muito certo. Num confuso estilo sci-fi (ficção científica), envolvendo mundos paralelos e viagens temporais, conhecemos Hamilton, um espião do século XIX que tem de matar uma versão mais jovem dele mesmo. Não sei dizer o que deveria ter sido mudado para que o conto fosse de todo agradável — talvez o personagem ou o enredo... Mas a história não é de todo ruim. Acaba sendo uma trama favorável aos admiradores do gênero.
Seguindo temos, para compensar a confusão do conto anterior, UM ANO E UM DIA NA VELHA THERADANE, uma ficção que mescla fantasia e steampunk de um forma incrível, escrita por Scott Lynch, famoso por sua série Nobres Vigaristas. No conto, narrado preternaturalmente em terceira pessoa e subdividido em capítulos curtos, somos levados a uma cidade despedaçada por uma guerra entre magos e sob ataque de magias mortais que caem dos céus, na qual um grupo desesperado de ladrões e fora da lei deve roubar algo impossível de ser roubado (uma rua) — e estão com pouco tempo para fazê-lo antes de terem de abrir mão de suas vidas. Foi, de perto, um dos melhores contos; ele é interessante do início ao fim. E, claro, repleto de humor inteligente e personagens que, mesmo sendo anti-heroicos, são épicos. Os amantes de boas fantasias vão adorar UM ANO E UM DIA NA VELHA THERADANE, assim como eu me apaixonei. Nota: 10!
Os livros deveriam ampliar nossa visão, nos levar a lugares onde nunca estivemos e mostrar coisas que nunca vimos, expandir nossos horizontes e nossa maneira de olhar o mundo. Limitar a leitura a um único gênero acaba com essa missão. Também nos limita, nos torna menores. Para mim, tanto no passado como agora, parece haver boas e más histórias, e essa era e ainda é a única distinção que realmente importa.
E diversificando ainda mais, temos um conto para os fãs de As Mil e Uma Noite: A CARAVANA PARA LUGAR NENHUM, de Phyllis Eisenstein. O conto também reutiliza o protagonista principal e o cenário de dois romances famosíssimos do autor, ainda inéditos no Brasil, e narra uma nova história de Alaric, o Bardo, nascido com a estranha habilidade de teletransporte. O bardo parte em uma caravana rumo ao interior imperscrutável do deserto, onde espíritos malignos uivam à noite e miragens são comuns — mas, como acaba descobrindo, nem todos os perigos são de fato imaginários. Narrado em terceira pessoa e com características épicas, A CARAVANA PARA LUGAR NENHUM é um conto bem fantástico, tanto em gênero quanto em caráter extraordinário. Foi um dos melhores — as reviravoltas, junto ao bom dinamismo e o suspense, foram a melhor parte, ainda que eu tenha sentido que o enredo poderia ter tomado rumos mais intrigantes. Nota: 9.
E, posteriormente, para os fãs de Romances Investigativos, GALHO ENVERGADO, do prolífico autor texano, Joe R. Lansdale, vencedor de prêmios como o Edgar, American Horror e Bram Stoker. Em GALHO ENVERGADO, Joe retoma seus mais famosos personagens, de sua série de mistério Savage Season, Hap Collins e Leonard Pine, que dão um show quando o assunto é "bancar o detetive". A filha da mulher de Hap está desaparecida e seu suposto namorado é encontrado morto na casa da garota — uma prostituta viciada em drogas. Hap se importava com isso, afinal era a filha da sua amada mulher. E se Hap se importava, era suficiente para que Leo também fizesse o mesmo, e é assim que eles acabam adentrando numa missão intricada e perigosa para resgatar uma donzela em perigo — embora não do tipo que você costuma encontrar em contos de fadas. Foi um dos contos mais rápidos que li, mesmo ele tendo o número de páginas próximo aos demais. Acontece que o autor soube ser bem objetivo, e mesmo quem não conhece a dupla Hap e Leo, sente como se os conhecesse de antigas leituras; isso trouxe um dinamismo muito bom. Não é tão misterioso o conto, mas ainda consegue ter um enredo interessante. Nota: 9.
Dando sequência, mais um conto fantástico — e, novamente, tanto pelo gênero quanto pelo caráter extraordinário. Em A ÁRVORE RELUZENTE, Patrick Rothfuss, best-seller do The New York Times, trouxe de volta os cenários de sua icônica série As Crônicas do Matador do Rei, que conquistou popularidade e elogios da crítica. Neste conto, Rothfuss nos leva até a expressiva hospedaria Marco do Percurso para acompanhar um dia típico na vida de um dos personagens mais populares de A Crônica do Matador do Rei, o misterioso Bast, aparentemente um menino de recados, que é muito mais do que parece — um dia no qual Bast aprende muitas lições e ensina outras tantas também. Definitivamente um conto nota 10! Deu-me até vontade de conferir a série na qual foi baseado o conto. A narrativa em terceira pessoa, aliada ao enredo muito bem feito e a escrita impecável de Rothfuss, me fez devorar o conto e perceber com bastante certeza que Bast, junto a Daemon Targaryen do conto O PRÍNCIPE DE WESTEROS, merecem o prêmio de "Melhor Canalha da Antologia".
Um dia, talvez, eu não mate de tédio pessoas
realmente inteligentes. A questão é: como você conhece
pessoas inteligentes?
— Vidente? Não.
— Vê coisas? Já teve premonições?
— Não.
Eu achava que toda aquela besteira de ler a sorte era
pura bobajada, como minha mãe diria. Ela era de uma
fazenda no sul do estado, essa parte era verdade.
Viveca parou de brincar com uma das contas.
— Nerd, estou tentando ajudar você.
Eu saquei. Normalmente não sou tão lenta, mas meu
pulso estava latejando. Aquele tipo de dor que distrai
e faz com que você só consiga pensar em como acabar
com ela. E também, em minha defesa, Viveca normalmente
só pergunta algo para poder falar — ela não liga
muito para as respostas.
Apresentando o penúltimo conto, temos a também renomada Connie Willis, com o conto EM CARTAZ. Para mim, foi um conto bem interessante, (1) porque trás uma mensagem verdadeira e importante e (2) tem um cenário, uma composição de personagens e toda a estrutura literária bem diferente das demais histórias. Não é fantasia, mas Willis criou um cenário aparentemente futurístico onde os cinemas são imensos parques que cumprem apenas um objetivo: fazer, sem que perceba, você gastar muito dinheiro! Narrado em primeira pessoa, o conto de história rápida, divertida e furiosa, leva-nos a uma noite no cinema que acaba sendo muito mais difícil e complicada do que simplesmente comprar um ingresso. Com características mais verossímeis e realidades mais juvenis, acredito que o conto é bem vindo depois de um mar de fantasia. Nota: 9.
E, para fechar com chave de ouro, a história de um Deles, do sangue do dragão, descendente dos grandes senhores da antiga Cidade Franca da Valíria, de uma beleza notável (alguns diriam inumana), cabelos branco-platinados, do fogo e do sangue, com vocês: Daemon Targaryen, em O PRÍNCIPE DE WESTEROS OU O IRMÃO DO REI, escrito pelo Rei da Literatura, vencedor de incontáveis prêmios, George R. R. Martin, autor da memorável série de fantasia As Crônicas de Gelo e Fogo. O PRINCÍPE DE WESTEROS, junto ao conto de Flynn, Lynch e Rothfuss, forma o quarteto de melhores contos da antologia. Nele, Martin nos leva à turbulenta terra de Westeros, lar de sua série As Crônicas de Gelo e Fogo, para contar a história do canalha fanfarão Daemon Targaryen, o príncipe que nunca chegou a ser rei — embora sua ambição de se tornar rei possa fazer eclodir a guerra em todo o mundo. Resumindo: foi um conto incrível, onde o autor abordou muitos fatos, mesmo com a brevidade característica do gênero. Os fãs de A Guerra dos Tronos, assim como eu, se sentirão abraçados por mais essa icônica história, feito por um autor ainda mais icônico. É aquele caso que, de 0 a 10, você dá 11.
Assim como a maioria dos leitores, meu único incômodo foi com a capa e o título do livro. Não que ela (a capa) seja feia; não é isso, ela é linda — uma das capas mais bonitas que já vi. Contudo, não podemos deixar de perceber que tanto a mesma quanto a edição foi alterada para entronizar George R. R. Martin, o que é injusto com os demais autores. O título original da antologia faz jus ao tema: Rogues (Canalhas, em tradução livre). No Brasil, o livro recebeu o nome de "O Príncipe de Westeros e Outras Histórias", estão entendendo a jogada editorial? Como disse a Gabi em sua resenha: o livro não é centrado no conto "O Príncipe de Westeros", então, achei desnecessário mudar o título a ponto de sugerir que esse fosse o "mais importante" da obra. Não demonizo a editora como um todo, visto que seu eu fosse dono de uma, faria a mesma coisa; mas não estou aqui na condição de editor, e, sim, leitor. Espero que esse tipo de "jogada" não aconteça mais, pois quando o livro é bom, ele pode ter o título que for, a capa que tiver, que vai vender e ser um sucesso editorial.
Quanto a edição como um todo, só posso dar os parabéns a Arqueiro pelo excelente trabalho prestado a nós, seus leitores. A edição é, sem dúvidas, um dos melhores trabalhos da editora, podemos perceber isso pela capa — que apesar de tudo, é extremamente bela — e a diagramação com folhas amareladas e com folhas pretas no início dos contos. Não encontrei nenhum erro de revisão e a equipe de mais de 7 tradutores parece ter seguido com bastante afinco o estilo de cada autor.
Por fim, só posso dizer que me senti extremamente feliz pela leitura — sem dúvidas, foi uma das melhores leituras do ano. Contudo, sinto vontade de ter contato com os demais contos. A Arqueiro podia lançar os demais em um segundo volume, não concordam? Foi muito interessante para pararmos por aqui, quero ler mais! Os autores foram preternaturalmente impecáveis e adorei conhecer os que ainda não conhecia; do mesmo modo como fiquei afeiçoado em conhecer novos gêneros. Como amante e escritor de contos, não poderia estar mais contente com o desenrolar de cada uma das histórias, pois, mesmo com a brevidade do gênero, todos os autores conseguiram, a seu modo, se saírem muito bem. Eu recomendo, para todos os leitores — afinal, O Príncipe de Westeros e Outras Histórias foi feito para agradar até o mais exigente dos leitores.
Primeiro parágrafo do livro:
"TODO MUNDO AMA UM CANALHA
... embora, às vezes, a gente sobreviva para se arrepender."
Melhor quote:
"O que é visto como clássico muda com o passar do tempo, assim como todas as outras coisas".
Já tinha ouvido falar desse livro, no entanto nunca tive oportunidade de conhecer mais sobre a história, porém após ler sua resenha da para notar o quanto a trama desse livro foi bem construída, o que torna a leitura envolvente e cativante, fiquei bastante interessada nesse livro, por isso vou inclui-lo na minha lista de desejados.
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